quarta-feira, 22 de novembro de 2017

1 – E depois que veio para onde estava a gente, chegou a ele um homem que, posto de joelhos, lhe dizia: Senhor, tem compaixão de meu filho, que é lunático e padece muito; porque muitas vezes cai no fogo, e muitas na água. E tenho-o apresentado a teus discípulos, e eles o não puderam curar. E respondendo Jesus, disse: Ó geração incrédula e perversa, até quando hei de estar convosco, até quando vos hei de sofrer? Trazei-mo cá. E Jesus o abençoou, e saiu dele o demônio, e desde àquela hora ficou o moço curado. Então se chegarão os discípulos a Jesus em particular e lhe disseram: Por que não pudemos nós lançá-lo fora? Jesus lhes disse: Por causa da vossa pouca fé. Porque na verdade vos digo que, se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: Passa daqui para acolá, e ele há de passar, e nada vos será impossível. (Mateus, XVII: 14-19).
            2 – É certo que, no bom sentido, a confiança nas próprias forças torna-nos capazes de realizar coisas materiais que não podemos fazer quando duvidamos de nós mesmos. Mas, então, é somente no seu sentido moral que devemos entender estas palavras. As montanhas que a fé transporta são as dificuldades, as resistências, a má vontade, em uma palavra, que encontramos entre os homens, mesmo quando se trata das melhores coisas. Os preconceitos da rotina, o interesse material, o egoísmo, a cegueira do fanatismo, as paixões orgulhosas, são outras tantas montanhas que atravancam o caminho dos que trabalham para o progresso da humanidade. A fé robusta confere a perseverança, a energia e os recursos necessários para a vitória sobre os obstáculos, tanto nas pequenas quanto nas grandes coisas. A fé vacilante produz a incerteza, a hesitação, de que se aproveitam os adversários que devemos combater; ela nem sequer procura os meios de vencer, porque não crê na possibilidade de vitória.
            3 – Noutra acepção, considera-se fé a confiança que se deposita na realização de determinada coisa, a certeza de atingir um objetivo. Nesse caso, ela confere uma espécie de lucidez, que faz antever pelo pensamento os fins que se têm em vista e os meios de atingi-los, de maneira que aquele que a possui avança, por assim dizer, infalivelmente. Num e outro caso, ela pode fazer que se realizem grandes coisas
            A fé e verdadeira é sempre calma. Confere a paciência que sabe esperar, porque estando apoiada na inteligência e na compreensão das coisas, tem a certeza de chegar ao fim. A fé insegura sente a sua própria fraqueza, e quando estimulada pelo interesse torna-se furiosa e acredita poder suprir a força com a violência. A calma na luta é sempre um sinal de força e de confiança, enquanto a violência, pelo contrário, é prova de fraqueza e de falta de confiança em si mesmo.
            4 – Necessário guardar-se de confundir a fé com a presunção. A verdadeira fé se alia à humildade. Aquele que a possui deposita a sua confiança em Deus, mais do quem em si mesmo, pois sabe que, simples instrumento da vontade de Deus, nada pode sem Ele. E por isso que os Bons Espíritos vêm em seu auxílio. A presunção é menos fé do que orgulho, e o orgulho é sempre castigado cedo ou tarde, pela decepção e os malogros que lhes são infligidos.
            5 – O poder da fé tem aplicação direta e especial na ação magnética. Graças a ela, o homem age sobre o fluído, agente universal, modifica-lhe a qualidade e lhe dá impulso por assim dizer irresistível. Eis porque aquele que alia, a um grande poder fluídico normal, uma fé ardente, pode operar, unicamente pela sua vontade dirigida para o bem, esses estranhos fenômenos de cura e de outra natureza, que antigamente eram considerados prodígios, e que entretanto não passam de conseqüências de uma lei natural. Essa a razão porque Jesus disse aos seus apóstolos: Se não conseguistes curar, foi por causa de vossa pouca fé.
O evangelho segundo o espiritismo

sábado, 21 de outubro de 2017

... Os planos inferiores do céu

Segunda, 29 de setembro de 1913. A idéia de ver as coisas do ponto de vista de uma esfera mais elevada que a sua, é para que se dê o verdadeiro valor quando se lê o que acabamos de escrever. De outra forma, você estará sempre enganado pela aparência de incongruência na associação das idéias que temos lhe passado. A nós é perfeitamente normal unir a chegada de nosso Senhor com o outro evento da formação daquela ponte que é a expansão da grande região do precipício. O que lá é visto concretamente – isto é, claro, concretamente para nós aqui – é apenas um fenômeno do mesmo poder invisível pelo qual o Senhor e suas legiões angélicas cobriram a abóbada celeste entre a esfera na qual agora nos movemos e aquelas de onde vieram eles. Você compreenderá que aquela Manifestação foi, para nós, muito mais que uma materialização é, para vocês. Foi a ligação entre dois estados do Reino do Pai pela união no espaço através das vibrações mais elevadas do que as que podemos usar nestas esferas mais baixas. Como tudo acontece, nós apenas podemos imaginar, mas, ao passarmos de sua esfera terrestre para esta, a conexão entre esta e a próxima não parece estranha. Desejamos que você pudesse ser melhor esclarecido ao observar algumas das maravilhas de nosso plano, pois então tudo lhe pareceria mais natural, tanto em sua jornada na terra, quanto também quando vier para cá e nada soar estranho em sua mente. A primeira coisa que veria é que a terra é o embrião do céu, e que o céu é apenas a terra purgada e aperfeiçoada; e em seguida veria que as razões são bem óbvias. Para ajudá-lo neste assunto, portanto, tentaremos contar-lhe de um sistema que temos aqui para separar e discernir entre as coisas que importam e as de menor importância. Quando estamos com alguma dúvida – e falo apenas de nosso círculo imediato – vamos ao topo de algum edifício, ou montanha, ou algum lugar elevado de onde possamos avistar as terras distantes que nos cercam. Então, expomos nossas dificuldades, e quando acabamos de completar o raciocínio, ficamos em silêncio por um tempo, esforçando-nos por retratar tudo dentro de nós, da forma como as coisas são. Depois de algum tempo começamos a ver e ouvir algum lugar mais alto que o nosso, e vemos que as coisas importantes são as que nos mostram, pela visão e audição, que ainda persistem naquele plano mais elevado, naquelas esferas mais altas. Mas não ouvimos ou vemos as coisas que não importam tanto, e é desta forma conseguimos separar uma categoria de outra. Parece tudo certo, querida, mas poderia dar-me um caso mais específico, a fim de exemplificar? Penso que sim. Tivemos que lidar com uma dúvida, e não sabíamos como agir da melhor forma. Foi sobre uma mulher que estava aqui por um bom tempo e não parecia capaz de progredir muito. Não era má pessoa, mas parecia ser insegura a respeito de si mesma e de todos os que a cercavam. Sua principal dúvida era sobre os anjos – se eles eram todos de luz e bondade, ou se alguns eram de um estado angelical e outros da escuridão. Por algum tempo não conseguimos ver o porquê disto estar perturbando-a tanto, já que tudo por aqui parecia ser amoroso e brilhante. Mas descobrimos que ela tinha alguns parentes que haviam vindo para cá antes dela, e a quem ela não vira e não conseguia encontrar seu paradeiro. Quando descobrimos o principal problema dela, discutimos entre nós e fomos ao topo da colina, colocando nosso desejo de ajudá-la e pedindo que nos fosse mostrada a melhor maneira. Uma coisa memorável aconteceu, tão inesperada quanto útil. Quando ficamos ajoelhados ali, todo o topo da colina pareceu tornar-se transparente e, enquanto estávamos ajoelhados, com as cabeças inclinadas, enxergamos diretamente através dela, e uma parte das regiões abaixo foi trazida a nós muito nitidamente. A cena que vimos –e todos nós a vimos, portanto não poderia ser ilusão – era numa planície obscura, árida e nua, e, encostado numa rocha, estava um homem de alta estatura. Diante dele, ajoelhada no chão, com as faces cobertas pelas mãos, havia uma outra pessoa. Era um homem, e parecia estar implorando algo ao outro, que continuava ali, com aparência de estar em dúvida. Então, finalmente, num impulso súbito, ele se abaixou e levantou em suas costas aquele que estava ajoelhado e o conduziu pela planície, em direção ao horizonte onde refulgia a luz pálida do crepúsculo. Ele andou uma longa jornada com aquela carga e então, quando chegaram a um lugar onde a luz era mais forte, ele o largou e apontou um caminho a ele; então vimos que este agradeceu muito e muito, então voltou-se e correu rumo à luz. Nós o seguimos com nossos olhos, e então vimos que lhe havia sido apontado o caminho da ponte, da qual já lhe falei – na extremidade que está no outro lado do precipício. Ainda não entendíamos por que esta visão estava sendo mostrada a nós, e continuamos seguindo o homem até que ele alcançou o enorme prédio que está no começo da ponte – não para guardá-la, mas para auxiliar os que chegam até ali, necessitando de descanso e ajuda. Vimos que o homem havia sido observado pelo guardião, pois um facho de luz sinalizou-o aos que estavam embaixo, mostrando-o ao guardião seguinte, ao longo da ponte. E então a colina reassumiu seu aspecto normal de novo, e nada mais foi visto por nós. Estávamos perplexos, mais que antes, e estávamos descendo a colina quando nossa Senhora Diretora veio ao nosso encontro, e em sua companhia estava alguém que parecia um alto servidor de alguma parte de nossa esfera, mas que não havíamos conhecido ainda. Ela disse que ele veio para nos explicar a instrução que acabáramos de receber. Aquele homem menor era o marido da mulher a quem estávamos tentando ajudar, e deveríamos dizer a ela que fosse até a ponte pois lhe seria dado alojamento ali, onde então poderia esperar até que seu querido chegasse. O homem mais alto que vimos era o que a mulher chamou de anjo das trevas, já que ele era um dos mais poderosos espíritos nos planos trevosos. Mas, conforme observamos, ele era capaz de uma boa ação. Por que, então, perguntamos, ele ainda estava nas regiões de trevas? O servidor sorriu e respondeu, “Meus queridos amigos, o Reino de Deus Nosso Pai é um lugar muito mais maravilhoso do que podem imaginar. Vocês jamais se defrontaram ainda com um reino ou esfera que fosse completo por si mesmo, independente e separado dos demais. Nem há nenhum assim. Aquele anjo trevoso mescla, em si, muitas esferas de conhecimento, bondade e maldade. Ele permanece onde está, primeiro por causa da maldade remanescente nele, que o incapacita para as regiões de luz. Ele permanece ali também porque ele poderia progredir se quisesse, mas mesmo assim ele não o deseja por enquanto, em parte por causa de sua obstinação, e parte porque ele ainda odeia a luz, e acha que os que partem para a horrível montanha são loucos, pois a dor e as agonias são mais intensas ali, em razão do contraste com o que vêem entre a luz e a escuridão. Então ele fica, e há multidões como ele, a quem uma espécie de desespero embrutecedor e estonteante impede de seguirem adiante. Também em suas horas de raiva e loucura, ele é cruel. Ele torturou e maltratou algumas vezes este mesmo homem a quem vocês viram com ele, e o fez com a crueldade de um fanfarrão covarde. Mas, como viram, isto foi superado e quando o homem implorou nesta última vez, alguma corda sensível no coração do outro vibrou um pouquinho só, e, num impulso, temendo uma reversão em suas intenções, liberou sua vítima que desejou empreender a jornada, e apontou-lhe o caminho, sem dúvida pensando em seu coração no quanto ele era estúpido e contudo, talvez, um estúpido mais inteligente que ele, afinal de contas.” Isso era novidade para nós. Não percebêramos antes que havia bondade naquelas regiões de trevas; mas agora vimos que era natural que assim fosse, ou, se todos ali fossem totalmente ruins, nenhum deles jamais desejaria estar conosco deste lado.” Mas o que tem a ver tudo isso com o discernimento entre as coisas que importam e as que têm menor importância? Tudo que é do bem é de Deus, e a luz e a treva, quando aplicadas aos Seus filhos, não são, e não podem ser, absolutas. Elas devem ser entendidas como relativas. Há, como sabemos, muitos “anjos das trevas” que estão na escuridão por causa de algum desvio em seu comportamento, algum traço de obstinação que os previne contra o que é bom dentro deles, fazendo esse efeito. E estes, um dia, podem nos ultrapassar na estrada das eras, e, no Reino dos Céus, tornarem-se maiores que nós, que hoje somos mais abençoados que eles. Boa noite, meu querido filho. Pense sobre o que escrevemos. Tem sido uma lição proveitosa a nós, e seria bom que muitos em sua vida atual pudessem aprendê-la.

A VIDA ALÉM DO VÉU I - Os planos inferiores do céu

Sexta, 26 de setembro de 1913. Nossa última afirmação foi dada em resposta a um pedido de alguém de nosso grupo, para que tentássemos impressioná-lo numa forma mais profunda que antes, mas conseguimos apenas começar, como aconteceu, e não acabamos nossa explanação. Se a deseja, continuaremos no tema agora. Sim, obrigado. Então você deve, por uns momentos, tentar pensar conosco como se estivesse do nosso lado do Véu. As coisas, você deve entender, aqui tomam um aspecto muito diferente do que elas têm quando são vistas a partir do plano terrestre, e um aspecto, temo, que os que ainda na terra desejam, pelo menos em muitos casos, que é usar um semblante de irrealidade e romance. E as mínimas coisas aqui são forradas com tanta dúvida pelos que são recém chegados que, até que eles tenham perdido o hábito de pensar em termos tridimensionais, ficam impedidos de progredir para longe. E isso, creia-me, é assunto de muita dificuldade. Agora, o termo “vibrações” deverá servir, mas está longe de ser adequado para as coisas materiais serem entendidas. Pois tais vibrações, como estas que mencionamos, não são meramente mecânicas quanto ao seu movimento e qualidade, mas têm nelas uma essência de vitalidade, e é dessa vitalidade que nos apropriamos e usamos. Esta é a ligação que conecta nossas vontades e a manifestação exterior em vibrações, já que é realmente isso que são todas elas. São apenas fenômenos da vida mais profunda que nos envolve e a todas as coisas. Com elas, como material básico, somos capazes de executar coisas, e construir coisas que têm uma durabilidade que o termo em si pareceria não corresponder. Por exemplo, é por este método que a ponte sobre o abismo entre as esferas de luz e de trevas é construída, e aquela ponte não é toda de uma cor só. No lado mais distante ela está imersa na escuridão e, conforme vai emergindo gradualmente, em direção à região de luz, assume um matiz cada vez mais brilhante, e, onde ela está assentada nas alturas em que começam os planos mais luminosos, é o matiz de cor de rosa e raios de luz que a envolvem como uma prata rara ou ainda o alabastro. Sim, claro, há uma ponte sobre o abismo. De outra forma, como poderiam sair aqueles que venceram os caminhos acima, através da escuridão? Verdadeiramente – e eu havia esquecido isso – há alguns que vêm dos terríveis reinos da escuridão, e escalam as regiões deste lado do abismo. Mas estes são poucos, e são os obstinados que rejeitam ajuda e guia dos guardiães do caminho que ficam parados no lado mais distante, para mostrar a saída aos que se qualificaram a isso. Também, devem saber, estes guardiães somente são visíveis a estas pobres pessoas na proporção em que a luz foi gerada em seus corações; e por isso uma certa cota de confiança é necessária se se entregarem à sua guarda. Esta confiança também acontece quando atingem uma mentalidade melhor, pela qual se tornaram, em certo grau, capazes de discernir entre luz e treva. Bem, as complicações do espírito humano são múltiplas e espantosas, portanto vamos a algo mais fácil de ser colocado em palavras. Eu acabo de chamar de ponte, mas.. eu deveria ter me referido a uma passagem, “A luz do corpo é o vosso olhar.” Leia isso ligando a tudo, e verá que faz parte do caso, não somente na terra, mas dos daqui também. Eu chamei de ponte mas, de fato, tem pouco a ver com uma ponte na terra. Estas regiões são muitos vastas, e a ponte é mais uma variação do terreno que outra coisa a mais que eu pudesse pensar para expressar a você. E lembre-se de que eu apenas vi uma pequena parte destas esferas, e por isso conto a você da parte que conheço. Sem dúvida há outros abismos e pontes – provavelmente numerosos. Através do precipício, ou da ponte, então, aqueles que buscam a luz empreendem sua jornada, e a jornada é bem lenta, e há muitas casas de repouso onde eles podem descansar, de vez em quando, em sua viagem progressiva; mudam de um para outro grupo de anjos mantenedores, até que o último estágio entregue-os aqui deste lado. Nosso trabalho na casa, ou colônia, à qual agora pertenço, é também direcionado a estes espíritos que progrediram até aqui, tanto quanto aos da terra. Mas este é um departamento diferente do meu, atualmente. Ainda não fui tão longe em meus estudos. É mais difícil, porque as influências em torno dos que estão nas trevas aqui são muito mais danosas que as influências na terra, onde boas influências estão sempre se mesclando com as más. Somente quando as pessoas carecentes e enfraquecidas chegam até aqui é que percebem a terrível tarefa diante delas, e este é o porquê de tantos permanecerem por tanto tempo numa condição de desesperança e desespero. Quando estão a salvo sobre a ponte, eles são recebidos por esses nas encostas onde a grama e as árvores crescem, e ficam estupefatos pelo prazer, em vez de se prepararem gradualmente. Pois ainda não estão acostumados ao amor e sua doçura, depois das experiências adversas lá embaixo. Eu disse que esta ponte se assentava nas alturas; falava comparativamente. O local da chegada é mais alto comparando com as regiões de escuridão lá embaixo. Mas, de fato, é região baixa; o plano mais baixo sem dúvida, da região celeste. Você está pensando na “garganta profunda”, ou precipício, “descritos” na Parábola. Está quase de acordo com o que lhe descrevi, e você já teve esta explanação em outro local. Também a razão pela qual estes que chegam fazem isso, em vez de atingirem este lado por viagem aérea, ou “vôo”, como talvez você chamaria, é porque eles não são capazes de completar a jornada desta forma por causa de sua fraca espiritualidade. Se eles tentassem isso, cairiam no vale escuro, perdendo então seu caminho. Não fui longe nestas regiões escuras, mas fiz uma pequena parte do percurso, e a miséria que vi foi mais que suficiente por bastante tempo. Quando eu progredir no atual trabalho, e tiver por algum tempo ajudado estas pobres almas lá do ponto avantajado daquela casa, e tiver permissão, e provavelmente terei, irei mais adiante entre eles. Mas não é para agora. Uma coisa mais eu posso dizer – já que por agora devemos parar. Quando eles surgem e chegam até a outra extremidade da ponte, devo dizer-lhe que o barulho que é ouvido, vindo por detrás deles, é horrível, e fagulhas vermelhas incandescentes são vistas. O que causa isso, não sou capaz de explicar claramente, mas nos dizem que os gritos, uivos e lamentações, e também as fagulhas, são enviadas por aqueles que ficaram para trás, que ficam enraivecidos por sua impotência de recapturar o fugitivo, ou de retê-lo em sua fuga; porque o mal é sempre impotente diante do bem, mesmo que o bem seja bem pequeno ao final das contas. Mas não devo continuar mais por agora, e o que estou dizendo agora não é o que vi pessoalmente, mas ouvi dizer, que quer dizer, foi dado a você de segunda mão, mas é verdadeiro, apesar de tudo. Boa noite, meu querido filho, e possa o Pai de Todos cobrir com Sua luz e paz a você e aos seus. Possa você ver luz na Sua luz, e o brilho daquela luz seja de uma aurora de paz.

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

O duelo (II)
Em certos casos, sem dúvida, pode o duelo constituir uma prova de coragem física, de desprezo pela vida, mas também é, incontestavelmente, uma prova de covardia moral, como o suicídio. O suicida não tem coragem de enfrentar as vicissitudes da vida; o duelista não tem a de suportar as ofensas. Não vos disse o Cristo que há mais honra e valor em apresentar a face esquerda aquele que bateu na direita, do que em vingar uma injúria? Não disse ele a Pedro, no jardim das Oliveiras: “Mete a tua espada na bainha, porquanto aquele que matar com a espada perecerá pela espada?” Assim falando, não condenou, para sempre, o duelo? Efetivamente, meus filhos, que é essa coragem oriunda de um gênio violento, de um temperamento sangüíneo e colérico, que ruge à primeira ofensa? Onde a grandeza dalma daquele que, à menor injúria, entende que só com sangue a poderá lavar? Ah! que ele trema! No fundo da sua consciência, uma voz lhe bradará sempre: Caim! Caim! que fizeste de teu irmão? Foi-me necessário derramar sangue para salvar a minha honra, responderá ele a essa voz. Ela, porém, retrucará: Procuraste salvá-la perante os homens, por alguns instantes que te restavam de vida na Terra, e não pensaste em salvá-la perante Deus! Pobre louco! Quanto sangue exigiria de vós o Cristo, por todos os ultrajes que recebeu! Não só o feristes com os espinhos e a lança, não só o pregastes num madeiro infamante, como também o fizestes ouvir, em meio de sua agonia atroz, as zombarias que lhe prodigalizastes. Que reparação a tantos insultos vos pediu ele? O último brado do cordeiro foi uma súplica em favor dos seus algozes! Oh! como ele, perdoai e oral pelos que vos ofendem.
Amigos, lembrai-vos deste preceito: “Amai-vos uns aos outros” e, então, a um golpe desferido pelo ódio respondereis com um Sorriso, e ao ultraje com o perdão. O mundo, sem dúvida, se levantará furioso e vos tratará de covardes; erguei bem alto a fronte e mostrai que também ela se não temeria de cingir-se de espinhos, a exemplo do Cristo, mas, que a vossa mão não quer ser cúmplice de um assassínio autorizado por falsos ares de honra, que, entretanto, não passa de orgulho e amor-próprio. Dar-se-á que, ao criar-vos, Deus vos outorgou o direito de vida e de morte, uns sobre os outros? Não, só à Natureza conferiu ele esse direito, para se reformar e reconstruir; quanto a vós, não permite, sequer, que disponhais de vós mesmos. Como o suicida, o duelista se achará marcado com sangue, quando comparecer perante Deus, e a um e outro o Soberano Juiz reserva rudes e longos castigos. Se ele ameaçou com a sua justiça aquele que disser raca a seu irmão, quão mais severa não será a pena que comine ao que chegar à sua presença com as mãos tintas do sangue de seu irmão! — Santo Agostinho. (Paris, 1862.)

(Fonte: O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. XII, item 12.)